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terça-feira, 30 de agosto de 2011

Realidade x Ficção




Realidade 1:
Um homem mais velho e outro mais novo foram praticamente linchados durante um rodeio (detalhe: o primeiro teve parte da orelha decepada por uma mordida).
O “crime” que eles cometeram?
Ora, abraçaram-se em público, demonstrando afeto entre PAI e FILHO!
Realidade 2:
Saindo de uma balada, quando se aproximavam da esquina da Rua Augusta com a Avenida Paulista, dois rapazes foram atacados com garrafadas e golpes de lâmpadas fluorescentes (sim, virou moda em São Paulo, já deve haver franquia para vender lâmpadas no bairro dos Jardins).
O “crime” que os baladeiros cometeram?
Ora, PARECIAM HOMOSSEXUAIS!
Realidade 3:
Uma estudante de psicologia sufocou, esfaqueou e ocultou em um canil o corpo do próprio filho recém-nascido, depois de ter escondido (como?) dos tios a gravidez.
O “crime” que o bebê cometeu?
Ora, NASCEU de um suposto caso da mãe com outro sujeito (sim, parece que ela já tinha um namorado em outra cidade)!
Ficção:
E eu vou continuar produzindo textos de ficção para quê? Para quem? A concorrência é desleal!

domingo, 28 de agosto de 2011

Nova Idade Média


 Hoje, foi realizado na Praça Vinicius de Moraes (em frente ao Palácio do Governo) um manifesto chamado “SOS Morumbi”. A intenção: mobilizar moradores da região e autoridades no sentido de combater a violência no bairro. Aqui, assaltos, roubos, sequestros e homicídios são frequentes. Segundo o UOL Notícias, “na quinta-feira (25/08), o governador de São Paulo anunciou o reforço do policiamento na região, 158 homens, 26 viaturas da Força Tática e 80 motos da Polícia Militar, cedidos por vários batalhões de São Paulo, fazem parte da força-tarefa com o objetivo de diminuir as taxas de criminalidade no bairro.” Sim, é verdade que as ruas estão cheias de viaturas. Mas até quando? É preciso haver ações de inteligência, polícia investigativa para encontrar os chefões, aqueles que armam os menores (chamados “noias”) para praticarem os crimes. 

 
Para quem não conhece, o Morumbi é um bairro que se confunde com vários outros, como Real Parque, Jardim Guedala, Vila Andrade, Paraisópolis, Vila Sônia... Ao contrário do Rio de Janeiro, em que as favelas estão no alto dos morros, a comunidade de Paraisópolis (que tem cerca de 80 mil habitantes) está numa espécie de cratera. Em volta e no alto, casas e condomínios de luxo. E as construtoras avançam cada vez mais em direção aos barracos (já nem tão barracos assim; a maioria é de alvenaria, com dois, três, até quatro andares). Não importa. O dinheiro fala mais alto, e as casas são demolidas. Sem dúvida, é uma panela de pressão pronta para explodir. Neste contexto, recrutar novos “noias” não é tarefa tão complicada. E creio que a “recompensa” não seja apenas um punhado desta ou daquela droga, mas um “barato” muito maior: poder extravasar todo o ódio acumulado!

sábado, 27 de agosto de 2011

Família?

Enquanto religiões e outros setores tão ou até mais retrógrados da sociedade atacam a união civil entre pessoas do mesmo sexo e o direito de gays ADOTAREM filhos, tomo a liberdade de transcrever neste espaço o assombroso depoimento de Severina da Silva, agricultora de 44 anos, desde a infância abusada sexualmente pelo pai BIOLÓGICO. Detalhe: com o consentimento da própria mãe BIOLÓGICA.
É esse modelo de família que deve ser “preservado” com “unhas e dentes”?
Será que não está na hora de deixar a hipocrisia de lado e repensar nossos (pre)conceitos?  

·······

Eu nunca estudei, nunca tive amiga, nunca arrumei um namorado na vida, nunca saí para ir a uma festa. Até os 38 anos, vivi assim, e foi assim até quando me desliguei do meu pai, no dia em que ele foi morto.
Meu pai não deixava eu e minhas irmãs fazermos nada. Toda a minha vida eu sofri. Comecei a trabalhar na roça ainda menina, com seis anos, arrancando mato.
Aos nove, fui com meu pai para o roçado. No caminho, ele me levou para o mato, amarrou minha boca com a camisa, me jogou de cabeça e tentou ser dono de mim. Eu dei uma pezada no nariz dele, e ele puxou uma faca para me sangrar.
A faca pegou no meu pescoço e no joelho. Depois, ele tentou de novo, mas não conseguiu ser dono de mim.
Em casa, contei para minha mãe e ela me deu uma pisa. Fiquei sem almoço.
À noite, minha mãe foi me buscar e me levou para ele. Me botou de joelhos na cama, tampou minha boca com o lençol e pegou nas minhas pernas para ele pular em cima. Eu dei um grito e depois não vi mais nada.
No outro dia, fui andar e não pude. Falei: "Mãe, isso é um pecado, é horrível". E ela: "Não é pecado. Filha tem que ser mulher do pai."
A partir daquele dia, três dias por semana, ele ia abusando de mim. Com 14 anos, eu engravidei. Tive o filho, e ele morreu. Eu tive 12 filhos com meu pai. Sete morreram. Seis foram feitos na cama da minha mãe. Dormíamos eu, pai e mãe na mesma cama.
Um dia, uma irmã minha disse que estava interessada em um namorado. O pai quis pegar ela, disse que já tinha um touro em casa, e que não era para ninguém andar atrás de macho lá fora.
Eu mandei minha mãe correr com minha irmã, e ele correu com a faca atrás. Depois disso, minha mãe não ficou mais com ele. Foram todos embora para Caruaru, para a casa do meu avô. Ela e as minhas oito irmãs.
Só ficamos eu e meu pai na casa. Eu tinha 21 anos, e ele sempre batia em mim. Tentei me matar várias vezes, botei até corda no pescoço.
Os filhos nasciam e morriam. Os que vingavam foram se criando. Minha filha estava com 11 anos quando ele quis ser dono dela. Falou assim: "Nenê está engrossando perninha? Tá saindo peitinho, enchendo a melancia? Tá bom de experimentar, que é para ir se acostumando." E tacou a mão nela.
Eu falei: "Seu cabra da peste, está escrito na minha testa que eu sou Maria-besta? Eu sou filha de Maria, mas besta eu não sou." E ele: "Rapariga safada, Maria era mulher para todo acordo. E tu, não tem acordo?"
Nessa hora, eu disse para ele: "Se você ameaçar a minha filha, você morre. Minha mãe aceitou, mas eu não." Meu pai me bateu três dias seguidos, deu um murro no meu olho que ficou roxo.
Na segunda, ele amolou uma faca e foi vender fubá [farinha de milho]. Antes, disse: "Rapariga safada, quando chegar, se você não fizer o acordo, vai ver o começo e não o fim."
Eu respondi: "Ô pai tarado da peste, se você ameaçar a minha filha, você morre." Ele foi para a feira e eu, para a casa da minha tia. Lá, mostrei meu corpo lapeado, o olho roxo, o ouvido estourado.
Meu pai tinha amolado uma faca de 12 polegadas na segunda-feira à noite e me mataria na terça se eu não fizesse o acordo. Foi quando paguei para matarem ele.
Peguei um dinheiro que tinha guardado, fui para Caruaru e, na casa do Edilson, paguei R$ 800 na hora.
Quando o pai chegou, o Edilson veio acompanhando. Foi quando acabou a vida dele. O rapaz arrumou um amigo e fez o homicídio. A faca que ele havia comprado, interessado na minha vida, ele morreu com ela.
A minha filha, a filha dele, eu salvei. Quem é pai, quem é mãe, dói no coração. Levar a sua filha para a cama, abrir os quartos dela, como a minha mãe fez, e o pai ir para cima da filha? Eu, como passei por isso, jamais iria aceitar.
Antes disso, eu ainda procurei os meus direitos, mas perdi. Há uns 15 anos, fui na delegacia, mas ouvi o delegado falar para eu ir embora e morar com o velhinho (o pai), que era uma boa pessoa.
O homicídio foi no dia 15 de novembro de 2005. No cemitério, já tinha um carro de polícia me esperando. Na cadeia, passei um ano e seis dias. Fiquei no castigo, depois fui para uma cela.
Depois do julgamento, fiquei feliz. Antes, pensava na liberdade e na cadeia ao mesmo tempo. Agora, quero viver e ficar com meus filhos. Quero que minha história sirva de exemplo, para que os pais e as mães procurem respeitar os seus filhos, ser amigos deles. A gente é pobre, mas pobreza não é desonra. Desonra é o cara fazer do próprio filho um urubu.
A partir de hoje eu quero é viver, porque tenho muita coisa para aproveitar pela frente. Tenho a liberdade e os meus filhos comigo.


(Guibu, Fábio. Folha de São Paulo, Cotidiano. Disponível em: <http://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/966007-minha-mae-me-levou-pra-ele-conta-mulher-abusada-pelo-pai-em-pe.shtml>. Acesso em: 27 ago. 2011)

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

"O tempo não para"

É engraçado como vamos aprendendo a lidar com o Tempo (antes, eu não escreveria com inicial maiúscula, mas agora...). Na minha adolescência, eu sequer me imaginava ultrapassando a “barreira” dos 40. Barreira, sim! Barra, barreira, obstáculo! Em uma sociedade voltada para a produção e o consumo de bens e serviços, aquele que não produz “mais” ou passa a consumir “menos”... vai se transformando em um “fardo”, algo que precisa ser “carregado” (pelo Estado, pela família e, principalmente, por si próprio – uma vez que passamos a acreditar que, socialmente, já não somos mais “tão úteis”). A palavra de ordem é: vamos, então, “ampliar” ao máximo a nossa juventude! E recursos não faltam. À medida que aumenta a expectativa de vida, maior é a oferta de remédios, cosméticos, tratamentos estéticos etc. Ora, não basta ficar vivo por mais tempo, é preciso ter saúde. Porém não basta ter saúde, é preciso parecer jovem, produtivo, útil. Enfim, o sujeito não pode se entregar, nem se tornar um peso morto (seja para quem for). Ser belo, ter músculos definidos, sorriso impecável e parecer jovem (aos 40, 50, 60 anos...) significa que aquela pessoa sabe se cuidar, tem autocontrole, é, sim, uma vencedora. Em outras palavras (para ser mais realista): o infeliz ainda presta para alguma coisa. E assim, a indústria da “saúde”, grande beneficiada com essa corrida desatinada contra o Tempo, contabiliza lucros astronômicos. Mas a verdade é que se ilude aquele que acredita que pode enganar o Tempo. Lamento, mas... não engana, não! Acaba se transformando em escravo de uma falsa imagem de juventude, uma caricatura de si próprio, mais um fantoche manipulado pelo sistema (pelas políticas públicas do biopoder).

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Bicho homem

No Rio Grande do Sul (sou de Uruguaiana), existe o "rodeio crioulo", semelhante ao de Barretos (SP), porém mais ligado às tradições gaúchas, do homem do campo etc. Quando eu era pequeno, achava tudo aquilo uma estupidez sem tamanho. No campo, na lida diária dos homens das fazendas, ainda vá... Mas não entendia a razão de animais (a dor e o desespero desses bichos) servir de divertimento ao público. Recebi muitas críticas (de familiares, inclusive). Alguns diziam que eu não gostava de ser gaúcho; outros, que eu era “mulherzinha”. “Bichinha é que tem essas frescuras”, bradavam. Bem, como eu era muito pequeno, ainda não entendia um monte de coisas. Sabia, no entanto, que não era nada bom ser chamado de mulherzinha. Na escola, outros iguais a mim (sensíveis e que não curtiam maus-tratos a animais) também eram perseguidos e “catalogados” como bichinhas (embora ainda nem soubéssemos o que era, de fato, ser “bichinha”). Em contrapartida, bem no fundo, eu gostava de não ser igual aos que me perseguiam, como faziam com aqueles animais do tal rodeio crioulo. Eu não queria agir (em nome de uma convenção social para o gênero masculino) feito um troglodita. Na minha visão (“torta” para muitos), animais irracionais eram aqueles peões desalmados, cavalgando e perseguindo bichos acuados e indefesos. Cresci. Continuo pensando como pensava naquela época. A diferença é que o medo de antes se transformou em força para lutar contra “certos machos” que, para se sentirem “mais machos”, chafurdam na barbárie. E pior: são ovacionados por isso. Não tenho nada contra as tradições, mas acredito que tudo tem que evoluir. 
Aprender a respeitar os animais, a natureza etc. certamente é o maior desafio humano para poder se libertar de todo tipo de ignorância.