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sexta-feira, 22 de julho de 2016

Pós-modernidade?



Andei sumido, porque não tinha muito o que dizer. Mas vamos lá...

Quando jovem, antes de visitar e/ou me hospedar numa cidade, eu costumava dar uma conferida na altura da torre das igrejas. Se fossem mais altas que os demais prédios, eu já tinha uma noção do que iria encontrar. Hoje, também dou uma investigada na quantidade de academias de musculação. Sim, porque, décadas atrás, eu ainda tentava descobrir quantas livrarias existiam, que tipo de livro vendiam e o volume de clientes nas lojas. Grandes ou pequenas, atualmente já quase não existem livrarias com livreiros de verdade, transformaram-se em "supermercados": muita gente dentro, mas poucos exemplares nas mãos dos frequentadores. Caixas praticamente sem ninguém para pagar por livros (outros produtos, sim). Há quem confunda livraria com biblioteca. Ou nem isso; o sujeito vai lá, lê de modo superficial, estraga o exemplar... e se manda dali sem adquirir obra alguma. 

As torres das igrejas, é verdade, já não são tão altas, mas se multiplicaram e se desdobraram em outras de variadas ladainhas sobre o mesmo Cristo & afins. Agora, igrejas e academias de musculação me ajudam a sondar os terrenos em que vou pisar. É tempo de fé e corpo em dia, cabeça prontinha para aceitar cabrestos (físicos e espirituais).
Essa é a tal pós-modernidade tão esperada? 
Parece que não. 
Infelizmente, andamos para trás. Perdemos alguma disputa/etapa no jogo da vida e fomos forçados a voltar muitas casas no tabuleiro da evolução.  



segunda-feira, 4 de julho de 2016



"Agora, mais que antes, Júlia acorda decidida e já vai direto para a sacada. Braços bem abertos. Mãos nervosas. Unhas negras querendo rasgar o ar. Se desse tempo, escreveria com o próprio sangue nas paredes: sou um pássaro de fogo que, no desesperado bater de asas, roga aos céus urgência para o seu voo. Respira fundo. Faz primeiro um sinal da cruz mecânico, apressado, mais pelos anos de condicionamento no colégio de freiras do que por fé. Depois, de olhos fechados, prepara o salto sem medo. Dali até a calçada, quase vinte andares. Mas a queda será macia, imagina, e tudo de ruim ficará para trás. Tombo rápido, morte que me chama sem dor. 

Metade do corpo saindo do parapeito... e a faxineira começa a girar a maçaneta da porta da suíte. 

Merda, Júlia resmunga, esqueci de trancar de novo! Pula de volta e disfarça, como tem feito ultimamente, ajeitando-se no chão para simular uma dessas complicadas posições de ioga. Não passa de hoje, promete a si mesma, acerto as contas e mando embora esse diacho de mulher enxerida!"

(© F. G. - trecho de novo conto sendo parido)     

   

quarta-feira, 29 de junho de 2016

Nova edição




Começando agora a revisar/rever meu primeiro livro da trilogia "Subterrâneos do desejo" para uma nova edição, encontro este pretenso poema "escrito" por um personagem tesudo e insone no conto "A vigília" (de CAÇADORES NOTURNOS, Desatino/2001). Engraçado como o tempo vai me distanciando de tudo e me expulsando de certas narrativas. Quanto mais produzo novos textos, mais percebo que sou apenas um datilógrafo de vozes que surgem sabe-se lá de onde. Nem quero saber. 

Aqui vão os versos...

"SOLIDÃO"


Coração:
Chaga separando vivas
Luzes
Dores
Madrugadas
Estrelas vazias
...
Sobre meus olhos:
Caminhos
Névoa morna
Soturnos encontros
...
Por esse amor:
Estendo mia solidão
Desejos e destemperos
Noites em brasa
...
Dos templos, confesso:
Perdidos horizontes
Amargos
Verdes
...
Do osso:
Nem mais o pó
...
Deus!
Vele esse meu pranto
De pérolas vazadas
Mortas
...
De outras moradas:
Outros veludos
Ganhem ânsias
Insônias
Serenatas
...
Dos sonhos distantes:
Vozes que ouço
Vultos gelados em noites de febre
Alma inquieta 
Carne nova no cio
...
Da fome:
Esquinas 
Viadutos
Ventos
Fúrias
Apressados funerais
...
Dessas noites:
Solidão de janelas que me beijam na boca
Presságios de camas nervosas
Amanhecidos desertos
...
Por último: 
Que o sol venha e lave 
Essa mia cara branca
Meu luto
Meus vícios
Meu fim
....
Amém!



segunda-feira, 27 de junho de 2016

Idas e vindas



Faz tempo... mas, ainda cursando Relações Internacionais, eu dizia: 
"Essa União Europeia não vai longe, nem Mercosul, nem coisa alguma desse tipo". 
E rebatiam em coro: 
"Que besteira! É o futuro!" 
Daí, eu me calava. 
Ora, nasci em uma cidade de fronteira (com a Argentina e o Uruguai). Quem nasce na fronteira, sabe que fronteira sempre será fronteira, nunca deixará de ser fronteira. E, dependendo da crise (sempre há tempos de crises – no plural mesmo), as fronteiras se tornam cada vez mais fronteiras. Muros são imediatamente erguidos e/ou abismos são cavados (invisíveis ou não). Cada um que fique no seu canto. E "dentro" desses "cantos", em tempos de crises (porque sempre vão e voltam esses tempos difíceis), não é raro que outras trincheiras e cercas sejam criadas para evitar que os "diferentes" se misturem de modo perigoso aos "iguais". 
Na verdade, não há "iguais" (nem em tempos de crises, nem nunca), mas muitos pensam que são parecidos. Assim, nessa ilusão/vontade de ser idêntico aos seus falsos pares, eles se sentem mais protegidos. Não, não estão. Nunca estiveram, nem estarão a salvo de nada quando a mentira impera. E todos ("diferentes" e "iguais") vão acabar pagando um preço muito alto por isso. 

Resumo da ópera (que pode parecer bufa no início, mas geralmente é bem trágica no final): Os "feudos" jamais deixaram/deixarão de existir.


terça-feira, 21 de junho de 2016

Meu passado me condena



No último domingo, durante um café com amigos, surgiu essa conversa sobre filmes que escrevi aos 18, 19 e 20 anos para a Boca do Lixo. Alguns diretores não queriam ir para o caminho do sexo explícito, então tentavam se aventurar em outros gêneros. Escrevi vários roteiros de terror "trash", mas bem "trash" mesmo. Dois foram filmados (pelo menos é o que sei; ainda não sabia assinar contratos, era muito moleque). A ordem que recebia era: quanto pior, melhor! 
Já nem me lembrava mais desse período... Pois vasculhando na net, vi que um deles foi lançado nos EUA (há muitos fãs de "trash" por lá).
Aqui vai a capa do DVD e o trailer com dublagens horrorosas dos gritos... Naquele tempo eu assinava "Greco" como "Grecco", por insistência do diretor.  
No elenco, havia atores da Argentina e Brasil. 
Que horror!!!!

Atenção: só assista se tiver coragem (em todos os sentidos) e estômago forte!!!!






segunda-feira, 6 de junho de 2016

Nos tempos do Cabaré do Ivo


Por falar em “Ivo Rodrigues”... Minha mãe teve salão de beleza na avenida Duque de Caxias (Uruguaiana, RS) – em números diferentes, mas sempre foi lá que ela trabalhou. Cresci ouvindo todo tipo de história. Volta e meia, surgia um novo comentário sobre o Ivo. Vamos ver se me lembro de alguns...

.  Nascido em São Borja, RS (alguns dizem que foi em Itaqui, RS), no último dia de julho na primeira década do século passado e abandonado pela família por causa dos trejeitos efeminados que iria apresentar com o tempo, Ivo foi criado na periferia de Uruguaiana por uma velha cafetina em um bordel simples (“tasca”, como se diz lá do Sul). Cuidou da mãe adotiva até o fim. Herdou dela o cabaré. Com gosto refinado e tino, digamos, bastante comercial, revigorou o lugar. Anos depois, já seria dono do bordel mais famoso e requintado da cidade, em uma região bem central.

Era um marqueteiro nato. “Segundo os mais antigos, faltando cinco dias para seu aniversário, Ivo mandava alguém de sua confiança até a emissora de rádio local e pagava dezenas de mensagens em sua homenagem. Aquilo era a largada, pois a partir daí as mensagens começavam a chegar de todas as áreas da cidade, o que fazia seu cabaré ‘bombar’ durante uma semana” (Olhares de Claudia Wonder: crônicas e outras histórias (GLS/Summus, 2008, p. 129-130). 
  
Ele gostava de andar de carruagem (carruagem, aliás, que está exposta hoje no Centro Cultural de Uruguaiana) e ia comprar tecidos finos nas melhores lojas da cidade;

. Embora se vestisse de mulher, fazia questão de ser tratado no masculino;

. Tinha joias caras, perfumes importados e uma coleção de bonecas e outros bibelôs trazidos de vários países;

Meninas “perdidas” (assim eram chamadas as moças que transavam antes do casamento; pior ainda... quando engravidavam) eram chutadas para fora de casa, e Ivo as recolhia nas praças, botecos, rodoviária e estação de trem. Se quisessem ser “da vida”, eram treinadas para tal. Caso contrário, podiam trabalhar em outras atividades no cabaré. Seus filhos (quando elas não queriam abortar), dizem, eram apadrinhados por ele. Não só para moças “perdidas”, mas as portas da casa do Ivo jamais estiveram fechadas para qualquer outra pessoa que precisasse de ajuda;

Para costureiras, encomendava vestidos para ele e suas “meninas”, porém enviava medidas e modelos. Se a roupa precisasse de algum acerto, as instruções seriam enviadas por escrito. Não permitia que as costureiras frequentassem o seu cabaré, nem autorizava suas meninas irem até elas;

Em festas, como Páscoa, Dia das Crianças, Dia das Mães, Natal etc., não havia expediente no cabaré, mas filas enormes se formavam na porta principal. Nenhuma pessoa carente (de qualquer idade, raça etc.) saía dali de mãos abanando;

. Certa vez, um tio meu, muito danado, mas ainda menor de idade, decidiu frequentar o tal cabaré. Sempre muito possante, ele aparentava ser mais velho. Minha mãe, responsável por este irmão (naquele tempo, era comum que as irmãs mais velhas terminassem de criar os irmãos caçulas), descobriu as aventuras do rapazote. Sempre muito durona, foi lá e bateu na porta do cabaré. Mas o Ivo não permitiu que ela entrasse, apenas pediu a um funcionário que ouvisse atentamente e lhe trouxesse a queixa da vizinha. Para desgosto do meu tio, nunca mais foi permitido que ele entrasse no cabaré;

. Quando minha irmã nasceu, em sinal de paz e simpatia, mandou que entregassem aos meus pais um joguinho de talheres para criança, de prata. Minha mãe diz que ainda guarda tal presente do Ivo;  

Também contam que ele, vestido de mulher, carregava um facão escondido embaixo da saia. Quando houvesse confusão no cabaré, ele acabava logo com a briga. Até os fuzileiros e os brigadianos (como são conhecidos os da Brigada Militar) o respeitavam. Eram os mais “brigões”. Porém bastava o Ivo gritar para que se retirassem da casa, que eles obedeciam prontamente;

Sua filantropia ia mais além da distribuição de presentes e alimentos aos necessitados, contam que ajudou muitos jovens em seus estudos, alguns se tornaram “doutores”;

. Na época de Getúlio e Perón, políticos importantes iam ao seu cabaré para tratar de assuntos internacionais;

. Aliás, era comum dizer que, em Uruguaiana, havia apenas dois pontos turísticos: a ponte internacional e o cabaré do Ivo;

. No carnaval, Ivo costumava ser destaque do bloco do Clube Caixeiral. Usava sempre a fantasia mais luxuosa dos desfiles. Era ovacionado. Para evitar a debandada geral do público, desfilava por último. Depois que ele passava, muitos iam embora; tinham ido até lá apenas para vê-lo;

. Nos bailes de carnaval, ele e sua “corte” passavam para cumprimentar os foliões. Era anunciado... Recebia aplausos enquanto dava um giro pelo salão. Agradecia. E logo ia embora. Isso era tradicional. Ou seja: a ilustre visita do Ivo Rodrigues em vários clubes da cidade fazia parte da programação do baile;

Não se sabe muito bem o real motivo, mas chegou um momento em que o cabaré do Ivo começou a decair. Parece que uma filha de criação montou outra casa – a contragosto do pai. A jovem fora criada em colégios caros, o pai não queria que ela seguisse naquele ramo. Mas a filha não só montou um cabaré maior e mais moderno, como fez concorrência direta... Daí veio o fim dos dias de glória do Ivo. Alguns comentam que isso aconteceu mais por desgosto do que por ele, de fato, ter perdido a mão no ramo dos grandes bordéis;

Pobre, velho e com a saúde debilitada devido ao uso abusivo de álcool nos últimos tempos, foi durante uma briga de rua em fevereiro de 1974 que o Ivo morreu. Tinha 66 anos;

Mesmo nessa fase final, decadente e já quase esquecido, uma multidão foi ao seu velório e acompanhou a pé o caixão pela avenida Duque de Caxias até o Cemitério Municipal. Calçadas lotadas... do mesmo jeito que elas ficavam nos desfiles de carnaval, quando Ivo se exibia para receber todos os aplausos;

. Hoje, em Uruguaiana, Ivo Rodrigues é nome de rua, escola de samba e, no dia de Finados, dizem que há romarias para prestar homenagens em seu túmulo;

Parece que há um projeto (ainda não aprovado) para que seja esculpida uma estátua em sua homenagem... Mas os tempos mudaram.

Claro que muitas “passagens” desta história podem ser puro folclore. Na “biografia” dos mitos, a realidade acaba se misturando à fantasia. Ainda vou pesquisar mais sobre a trajetória do Ivo... Um desafio que talvez possa render um novo trabalho.   


sábado, 28 de maio de 2016

Vale a pena!!!!!!






Elenco e espetáculo impecáveis... mas a entrega (corpo e alma) da Maria Luisa Mendonça nessa montagem de Um bonde chamado desejo é impressionante! Não é apenas uma grande atriz em cena, é algo inexplicável, um ser que, mais que interpretar com as bênçãos dos deuses do palco, "veste" por completo o teatro, como já escreveu Proust ao ver Sarah Bernhardt em cena. 

O Juliano Cazarré não deixa nada a desejar ao Stanley Kowalski do Marlon Brando (tanto do teatro quanto da versão para a telona). É um ator de total entrega, sem os pudores babacas dos que se deixam engessar pela maldição dos tais galãs de telenovelas. É ATOR e ponto final.

http://www.morenteforte.com/pecas/em-cartaz/bonde-chamado-desejo/

Recomendo MESMO! Tennessee Williams é atemporal. Ou mais que isso: bem atual nestes tempos de machismos e retorno à Idade Média.

"Eu te digo o que eu quero. Magia! Sim, magia! Eu tenho que dar isso pras pessoas. Eu transfiguro as coisas para elas. Eu não digo a verdade. Eu digo o que deveria ser a verdade. E se isso é pecado, então me condenem à danação!" (Blanche DuBois).

Esta prorrogação de temporada vai até 26 de junho. 

Tem que correr lá! Comprar com antecedência... Merecidamente, as sessões lotam!

quarta-feira, 25 de maio de 2016

Cada um vê o camaleão que pode (ou quer)




A arte não tem uma função óbvia e prática. Não é, por exemplo, como consumir um prato cheio de comida. Ela provoca movimentos, desloca, tem a força transgressora de oferecer bem mais do que os nossos sentidos podem captar de imediato. Aguça lentamente outros canais de percepção do real. 

Não é item de cardápio de "fast-food". Faz parte da alta gastronomia (ainda que, num primeiro momento, o prato nos pareça abjeto/indigesto). Precisa de tempo, paciência e muita entrega (tanto do artista quanto do público). 

Quem ainda não tem esse grau de entendimento, certamente veria neste vídeo do "YouTube" apenas o bicho, a imitação de um réptil. Os intelectualmente limitados/despreparados, apenas duas mulheres nuas, uma exibição indecente que faz apologia à atração/relação lésbica.

Vem desse tipo de pensamento (curto) a ideia equivocada de que artistas são pessoas vagabundas, que vivem do dinheiro alheio. Ora, no fundo, todos nós vivemos de vendas de serviços e/ou mercadorias. 

Cada um vende o que tem de melhor a oferecer. Compra quem quiser e/ou puder.

A propósito, ateus como Michelangelo Buonarroti  e Leonardo da Vinci, graças ao generoso mecenato de religiosos e grandes monarcas, deixaram obras magníficas exatamente sobre o que eles não acreditavam. Exemplos nesse sentido não faltam... Portanto, independente do que é ou deixa de ser o artista (como pessoa), o que vale é o que ele é capaz de produzir. E muitas obras, só com o tempo serão compreendidas.

Arthur Rimbaud ("descoberto" e valorizado apenas depois de morto) que o diga: "Enfant, que fais-tu sur la terre? /  – J'attends, j'attends, j'attends!..." ("Filho, que fazes na Terra? / – Eu espero, espero, espero!..." – Em tradução livre.) 

Levei muito, muito, muito tempo para me reconhecer/assumir como um criador. Foi extremamente difícil e doloroso me libertar dessas vozes: "Um vagabundo, é isso que você quer ser? Por que não arranja um trabalho decente? Vai acabar nas ruas, como um mendigo..."

Até hoje, de vez em quando, elas ecoam na minha mente, fazendo com que eu me sinta culpado por ter esse dom e, por isso, passar a vida inteira nadando contra tudo e todos. E pior: quase sempre vivendo das sobras.


sexta-feira, 13 de maio de 2016

Filme antigo




Collor assumiu a presidência e, em pouquíssimos dias, acabou com a Embrafilme, a Funarte e a cultura em geral. Pensamento é algo perigoso. Tem que ser calado ou mantido com rédea curta.

Bem, mas Collor votou lá, no Senado, a favor do impedimento da Dilma, alegando que ela "usou indevidamente o dinheiro público". Pois é, o mesmo que confiscou a grana de todos nós e tentou calar um país. 

Hoje, filme velho rebobinado, lá se vai novamente a cultura. Repito: pensar é uma ameaça em países em que o povo deve apenas ser adestrado para ser pacífico, obediente e continuar apertando parafusos nas fábricas (de preferência, estrangeiras)! Vejam o lema positivista na bandeira, "ordem e progresso"... Só falta completar, explicando de quem é o progresso, da grande maioria dos brasileiros nunca foi. Vamos lá... Quanto ao "novo" ministério, nem é preciso tecer comentários, basta "dar um Google" em cada nome (mas isso tem que ser feito rápido, antes que os "currículos" sejam reescritos e se tornem exemplares num piscar de olhos). Em paralelo, alguns suspeitos de corrupção já foram (ou estão quase) "inocentados". Mais adiante, saídos de uma reunião com o Temer, dois "homens de Deus" (Malafaia e Feliciano) exibem sorrisos vitoriosos. Em postagem recente, Malafaia comemora o fim do Minc... Com outras palavras, ele alega que "aquilo" era um antro de esquerdopatas.

Pois é... Amigos gays, artistas, pensadores e afins, preparem seus passaportes, vistos, malas, tudo! As fogueiras começam a ser montadas.

Sarcasmo? Não. O tempo mostrará...

Não estou brincando.

Infelizmente, falo sério.

OBSERVAÇÃO IMPORTANTE 1: Não, nunca captei recursos para projetos via Lei Rouanet. Sim, já recebi vários prêmios em dinheiro, bens (um carro) e em troféus (em "concorrências" públicas e privadas), mas foi graças a qualidade artística dos projetos apresentados. Jamais fui filiado a partidos políticos ou fiz conchavos para ganhar algo. Sim, sou homossexual e tenho um relacionamento fixo há quase vinte anos. Sim, como em qualquer país minimamente desenvolvido, a cultura deve ter mecanismos de financiamento governamental. Não, não sou satanista, uma aberração da natureza, nem esquerdopata (como o sr. Malafaia e outros "homens de Deus" provavelmente queiram me "catalogar")... apenas um contador de histórias que também tem ajudado outros autores (de ficção ou não) a publicar seus livros.

OBSERVAÇÃO IMPORTANTE 2: Por gentileza, não compartilhem esta postagem; trata-se de um desabafo pessoal, uma indignação... não uma "campanha". Já está publicada, leia quem quiser.



quinta-feira, 12 de maio de 2016

A maldição de Eva



Certa vez, por telefone, a Rose Marie Muraro (uma das feministas pioneiras deste país) me disse que não queria mais saber de escrever sobre as mulheres: 

"Estive lá, no meio daquele inferno criado e dominado pelos homens, lutei que nem louca. E sabe o que consegui? Um câncer que quase acabou comigo."


Camille Paglia, outra intelectual que lutava pelos direitos das mulheres, mas que também acabou desistindo disso, escreveu o seguinte em um ensaio erudito de quase 700 páginas, lançado nos anos 1990, q
ue trata de arte, civilização e sexo (em trechos aqui editados): 

“O corpo feminino é uma máquina ctônica, indiferente ao espírito que o habita. Organicamente, tem uma missão, a gravidez, que podemos passar a vida repelindo. A natureza só se importa com a espécie, jamais com os indivíduos: as humilhantes dimensões desse fato biológico são experimentadas de maneira mais direta pelas mulheres, que provavelmente por causa disso têm maior realismo e sabedoria que os homens. [...] A gravidez demonstra o caráter determinista da sexualidade da mulher. Toda mulher grávida tem o corpo e o ego tomados por uma força ctônica além do seu controle. Na gravidez desejada, é um sacrifício feliz. Mas na indesejada, iniciada por um estupro ou azar, é um horror. Pois o feto [torna-se então] um tumor benigno, um vampiro que rouba para viver. O chamado milagre do nascimento é a natureza dando as cartas. [...] O insuportável mistério do corpo feminino aplica-se a todos os aspectos das relações dos homens com as mulheres. Que aparência terá aí dentro? Ela tem orgasmo? É mesmo meu filho? Quem foi de fato o meu pai? O mistério envolve a sexualidade da mulher. Esse mistério é o principal motivo para o aprisionamento que o homem lhe impôs. [...] A mulher é velada. O despedaçamento violento desse véu talvez seja um dos motivos dos estupros por gangues e assassinatos com estupros [...]. Os crimes sexuais são sempre masculinos, nunca femininos, porque tais crimes são ataques conceitualizadores à inatingível onipotência da mulher e da natureza. O corpo da mulher contém uma célula de noite arcaica, onde todo conhecimento deve parar. Esse é o profundo significado por trás do ‘striptease’, uma dança sagrada de origens pagãs, que, como a prostituição, o cristianismo jamais conseguiu liquidar. As danças eróticas de machos não são comparáveis, pois uma mulher nua leva para fora do palco uma ocultação final, aquela escuridão ctônica da qual viemos.” (Personas sexuais: arte e decadência de Nefertite a Emily Dickinson, Companhia das Letras, 1992, p. 21-22 e 32,)

Por que transcrevi estes trechos aparentemente desconexos da fala da Rose e da obra da Camille? 

Bem, os que estiverem atentos a essa nova-velha onda (mundial) machista, patriarcal, heterocentrada, misógina, sexista etc. entenderão o motivo. 

Mais que disputas/desavenças nas políticas partidárias, o que parece ter (re)começado no Brasil e em outros países (inclusive, nos que são considerados “mais evoluídos” – vejam o que os ultraconservadores estão tentando fazer com Angela Merkel... no caso dos refugiados) é um ataque (já nem tão) velado às conquistas femininas/sociais. 


Estou exagerando? 

Talvez sim... 

Mas, embora não acredite que ela se eleja, penso que Hillary Clinton também será perseguida e destruída tão logo “se atreva” a não seguir a cartilha machista do poder.   

Tomara que eu esteja errado!!!! Aliás, é o que mais tenho dito ultimamente.




sexta-feira, 6 de maio de 2016

Minha mãe...

Então... Vendo, desde cedinho, que muitos postaram fotos com suas mães, eu disse: “Vou postar a nossa!” E havia algumas. Tá bom: pelo menos... uma. Juntos, posamos para poucas fotos. Só agora percebi isso. E o tempo que foi passando cada vez mais apurado (em "gauchês", significa apressado, impaciente...), etapas que deixaram de ser registradas em imagens, mas que ficaram bem guardadas na lembrança. 

E cadê a tal foto? 

Vasculhei tudo, e nada... A verdade é que tenho a estranha mania de não guardar por muito tempo fotos em papel. Daí, fui lá, nos baús do Rogério. Quando jogo fora, ele (na surdina) guarda tudo outra vez, mas nas coisas dele. 

Nada, não encontrava foto minha com a mãe. Às vezes, eu guardava fotos em livros. Mas volta e meia, ao me desfazer deles... “adeus fotografias”. Devem andar viajando por aí, de mão em mão. Sei, devia ter mais cuidado... 

UFA! Salvo pelo Rogério: achei! Nesta, já bem antiga, da esquerda para a direita: Tais Freitas​ (prima), Thomás Freitas Pinto​ (primo), Felipe (eu), Negrinha (mãe) e Elizabeth (mana). 




Mas, voltando ao tema... De saúde frágil, minha mãe é uma das mulheres mais guerreiras que já conheci. Decidida. Imponente e feroz até no signo: leão. Dela, fui companheiro de estrada. Como tinha salão de beleza e loja, desde muito cedo, nas férias escolares, ia com ela... feliz da vida... cada vez mais longe (Santa Catarina, Paraná, São Paulo...), buscar mercadorias. Até o dia em que fiz as malas... e saí de casa. 

“Não quero que olhes para trás para ver tua mãe chorando”, foi o que ela me disse. 

Eu tinha 17 anos, queria sair logo do ninho. Quase todos da minha geração queriam isso. Nem bem eu havia colocado os pés em São Paulo, ela me ligou: “Puxa, nem um tchau!” E eu: “Mas tu não me pediste para não olhar para trás?” (“Tu”, porque meus pais detestam ser tratados por “senhores”.)

E foi nesse vaivém de beijos e rusgas que aprendemos a dançar a nossa difícil coreografia familiar. Há dias de amor e fases de muita turbulência. Somos muito parecidos. Ambos com um temperamento do cão. Da mesma forma que rimos, rosnamos um para o outro. Mas, bem no fundo, sei que nos admiramos muito. Um jeito de amar à distância, reconhecendo e respeitando territórios. Sem filtros ou mitos. Amor transparente. Não poderia haver outro sentimento entre dois obstinados, nem eu saberia viver metido num amor melado, convencional e piegas. Em sinal de gratidão, já dediquei vários livros a ela. Muitas mulheres dos meus textos vêm dela, dessa leoa furiosa e passional.

Reconheço que voltei poucas vezes ao Sul. Voltarei em breve (não perguntem quando, porque desisto). Demoro anos, uma década... Voltando, faço “visita de médico” (quatro dias, no máximo; mais que isso, vamos parar nas páginas policiais, na jaula de algum circo ou num hospício... rsrs!)... mas volto. É sempre bom voltar às origens, resgatar memórias, rever paisagens, tentar desatar alguns nós... Enfim, como na música de Astor Piazzolla e letra de Fernando "Pino" Solanas...

Vuelvo al Sur,

como se vuelve siempre al amor,
vuelvo a vos,
con mi deseo, con mi temor.
Llevo el Sur,
como un destino del corazon,
soy del Sur,
como los aires del bandoneon. 
Sueño el sur
Inmensa luna, cielo al reves.
Vuelvo al sur
El tiempo abierto y su despues
Quiero al sur.
Su buena gente, su dignidad.
Siento al sur.
Como tu cuerpo en la intimidad.
Te quiero, sur 
Te quiero, sur...