Sobre o aniversário de Sampa, tomo a liberdade de compartilhar com vocês esta história (verídica)...
Eu devia ter 18 ou 19 anos, por aí. Morava sozinho em uma quitinete na
Duque de Caxias, entre o Largo do Arouche e a avenida São João. Naquela época,
escrevendo para cinema, eu viajava
bastante a trabalho. Depois de uma temporada mais longa, ao voltar para o meu
apê, encontrei um ninho de pomba na sacada. Sim, sabia de todas as doenças que
podem ser transmitidas etc. Mas como jogar aqueles ovos fora? Limpei tudo em
volta, fazia isso sempre... e a pomba, ali, já acostumada comigo, chocando.
Nasceram os filhotes: três. E piavam dia e noite. Eles eram o
meu despertador.
Mãe-pomba pra lá e pra cá. A fome daquele trio era
insaciável. A disposição dela (cada vez mais magra), incrível.
Mais uma temporada fora, e voltei para casa. Os três já
estavam grandes. E a estiva de abastecimento da mãe parecia ter piorado.
Certa madrugada, acordei com uma briga entre as aves... Abri a
cortina e lá estava a mãe-pomba furiosa, distribuindo bicadas violentas nos filhotes.
Uma sangueira na sacada... Peguei uma vassoura, e expulsei a malvada aos berros.
Dali em diante, um olho na máquina de escrever (ainda não
havia computadores como hoje) e outro na sacada, passei a monitorar as visitas indesejadas
da mãe desnaturada, que já não trazia tanta comida como antes... Com pena dos filhotes, passei a dar água e migalhas
de pão a eles... Se não fizesse isso, iriam morrer à míngua. Pelo menos, era o que eu pensava.
Mas bastava eu me descuidar, que ela avançava neles. Para se protegerem dos ataques, os coitados se enfiavam nos cantos, se encolhiam, piavam... batiam e batiam suas asas.
E eu na vigília, vassoura em punho, me desdobrando para afugentar a pomba-megera.
Água limpa, migalhas de pão... eu e o meu ninho.
A pomba-mãe não desistia. Deu tanta bicada nos filhotes que
eles, finalmente, tomaram coragem, escancararam bem as asas e saltaram lá do
alto (cinco andares). Pronto: a missão dela estava cumprida... os filhotes
ganharam o mundo. Inseguros e desajeitados no início, mas logo dominaram o voo. Sumiram.
Limpei tudo ali, porque eles nunca mais retornaram.
Minto; a mãe voltava de vez em quando. Ficava comigo na
sacada. Até que chegou a minha hora de partir...
Décadas depois, e ainda me lembro disso... com todos os detalhes. Mas agora vejo tudo aquilo como
uma bela metáfora. São Paulo é mais ou menos assim com seus filhos (legítimos ou
não): bate e logo assopra. É mãe zelosa, mas extremamente exigente. Quando dá
porrada, é para que a gente aprenda a voar cada vez mais longe, confiante, destemido, livre. Não é terra para quem se acomoda no ninho. Não mesmo!
Feliz aniversário, Sampa!
Minha gratidão por tudo!!!
Sempre!!!
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