Total de visualizações de página

sexta-feira, 9 de novembro de 2018

Andando em círculos






Domingo passado, ao rever na televisão o filme MEMÓRIAS DO CÁRCERE, baseado no livro homônimo de Graciliano Ramos, dirigido por Nelson Pereira dos Santos, fiquei pensando o quanto a história se repere. É a tal “espiral do eterno retorno” proposta pelo filósofo Friedrich Nietzsche. Embora o filme não seja um dos melhores do Nelson e tenha envelhecido em termos estéticos e “dramáticos” (na interpretação dos atores), o roteiro mostra a Ação Integralista Brasileira (AIB) do período Vargas (uma ditadura sob o comando de um populista, que foi tema do meu Trabalho de Conclusão de Curso na faculdade de Relações Internacionais). 

Com o pavor (quase surreal) do comunismo disseminado nas multidões (que nem sabiam o que era comunismo) e pela moral e os bons costumes (defendido pelas famílias e igrejas), o Brasil mandava os descontentes (tidos como “inimigos da pátria”) para os calabouços. Houve perseguição, tortura e extermínio naquele período. Quando os Integralistas cansaram Getúlio com o seu “Anaê”,  grito de guerra que significa “você é meu irmão” (em tupi), foram dispersados e passaram a constar apenas nos livros de história. 

Em 1964, com novo golpe, militares (hoje se sabe que apoiados por Whashington) tomavam o poder com a mesma desculpa de “pela moral, pelos bons costumes e para afastar o comunismo”. Sim, a boa e velha desculpa de “comunismo”. Aliás, se não existisse o “comunismo”, não sei o que o seria dos movimentos de ultradireita. Talvez perdessem a força que a maioria das religiões tem ao pregar o “grande perigo” do pecado, do diabo, do inferno etc. Sem o fortalecimento do medo pelo desconhecido, multidões de fiéis se dissolveriam em pouco tempo. 

E hoje estão de volta o discurso de ódio, o puritanismo e a tão temível "invasão comunista". O “outro” também volta a ser “o degenerado”, “o comunista”, “a ameaça à família e aos bons costumes”. Os “bons e sãos” são agora como Integralistas repaginados pelos recursos da informática; suas ideias extremistas e medos infundados se espalham com maior velocidade e força de persuasão.     

Enfim, a história não é linear, como queremos e nos ensinam a acreditar que seja; ela se move em círculos num vaivém infinito. Nietzsche, internado em manicômio após um colapso mental, talvez sofresse de excesso de lucidez em um mundo programado para ser insano. Os desajustados somos nós que ainda acreditamos que a sociedade tem conserto. Não tem. Não pode ter. Há outros interesses em jogo que mantêm as engrenagens emperradas para que o poder de alguns se perpetue. 

Ou você ainda acredita que a saúde, a educação e a segurança voltarão a ser boas para todos algum dia, indistintamente, quando há centenas, milhares de empresas do setor privado que lucram fortunas com essa “deficiência” nas políticas públicas? 

Bom, se acredita, estará a salvo, pois continuará se entregando a promessas vãs e ameaças que nunca existiram de fato (pelo menos, não com a força que foi propagada). Os "sãos e bons" são os que não destoam. Se contestar a "ordem" imposta, irá para o calabouço, o hospício ou para a cova.

Gostemos ou não, é assim que tudo funciona.

   



Nenhum comentário:

Postar um comentário