Em 1985, quando saí de Uruguaiana, ainda adolescente,
para estudar e trabalhar em Sampa, disseram que eu só podia ter enlouquecido:
— Ir pra tão longe, pra quê? Todos os teus amigos foram
para Porto Alegre, tens parentes lá! É mais fácil!
Já vivendo em São Paulo, ao pedir demissão de um
emprego de divulgador de livros em uma grande editora para escrever roteiros de
cinema na Boca do Lixo, mais protestos:
— Isso é uma loucura!
Veio a Era Collor, e quase todos do cinema ficaram sem
emprego. Por caridade, um tio me arranjou uma vaga no setor de faturamento de sua
metalúrgica. E lá fui eu, de volta pro Sul, faturar pilhas de notas fiscais.
— Coitado, ele deve ter enlouquecido mesmo — diziam pelos
cantos.
Mais adiante, no início da década de 1990, ganhei uma
bolsa e fui estudar na Argentina:
— Você ficou louco?
Passado um tempo, recebi um convite e fui morar e trabalhar no Rio de
Janeiro:
— Se você gosta tanto de São Paulo, morar no Rio pra quê? Ficou louco?
Pois quando consegui voltar a São Paulo, trabalhando na
área de Comércio Exterior, bom salário, garantias e tudo mais:
— Você não queria escrever? Trabalhar em uma
multinacional, ficou maluco?
Daí, quando larguei tudo e fui, finalmente, escrever
(nome da editora: Desatino):
— Você tá louco se acha que vai viver disso!
E agora que, como autor, vou chegando ao fim da minha
meta (escrever/publicar sete livros do Greco) e digo:
— Bem, meus caros, cumpri o prometido; é hora de partir
para outra empreitada.
Em coro, rebatem:
— Deus do céu! Você só pode estar louco! E vai fazer o
que com essa idade?
Penso (mas não muito, óbvio) e respondo:
— Talvez, como todo mundo, tentar ser feliz. Felicidade
é coisa que vai mudando, conforme a gente muda.
Sim, acho que todos têm razão: sempre fui louco; não creio na eternidade das coisas, também não
tenho medo da vida, menos ainda dos meus desejos (por mais transitórios que pareçam). Faço o que quero e sigo aquilo que me
dá na telha. Porém, não deixo nada por fazer. Se sinto alguma vontade, logo sacio. Se começo, termino, vou até o fim. Custe o que custar.
Obs.: vejam, pensei nisto agora... Quem sabe eu ainda não arranje filhos mais doidos que eu, uma mulher bem apaixonada, carola e faladeira, papagaio (cachorro danado já tenho), rugas de tédio, um pinto murcho e uma barriga enorme de chope... Mas acho que ainda assim alguns vão dizer: "Pois é, agora ele enlouqueceu de vez!" Ou seja: pra gente como eu, não há escapatória; nada estará de acordo com as expectativas.
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