Noite que deveria ser de festa para os apaixonados
por futebol: Corinthians foi campeão lá... do outro lado do mundo. Mas, de
repente, em uma rua de mão dupla, que se torna cada vez mais estreita à medida
que motoristas estacionam seus carros de qualquer jeito e em ambos os lados, um
morador dá seta para entrar no portão do condomínio. Outro motorista, vestido
com o uniforme do time vencedor, vem em direção contrária e bloqueia a passagem
do tal morador.
— Dá ré aí, cara! Quero passar, porra!
— Eu estava primeiro, moro aqui, dei seta — argumenta o
morador, família inteira no carro, crianças pequenas olhando assombradas.
Dali em diante, gritos, ameaças... até que aparece um
policial, arma em punho.
— O que tá pegando aqui? — “Pegando”, exatamente o que ele
disse.
Explicações de um e de outro, sendo que o “torcedor” parecia
um pouco mais alterado que os demais. Daí, a coisa se complicou: o policial
pediu para que o rapaz saísse do carro com as mãos para o alto, encostasse no
muro...
— Cala a boca, arrombado! Encosta ali, seu filho da puta! E não me encara! Tá querendo
me peitar, tá? Tá querendo meter banca pra cima da lei?
Nisso, já havia se formado um congestionamento na estreita
rua Pasquale Gallupi, a um quarteirão da Giovanni Gronchi, principal avenida da
região do Morumbi.
Não deu para ouvir direito, mas algo dito pelo corintiano
desagradou mais ainda o policial, que começou a dar tabefes no rosto do rapaz, vários.
— Não olha na minha cara, seu bosta! Já disse, olha pro
chão!
Alguns moradores, indignados com a cena, começaram a
protestar.
— O senhor não pode fazer isso!
— O homem tá quieto!
A resposta do policial: — Vão se foder!
Outra viatura apareceu. Outro fardado, creio que de patente
superior, passou a conduzir a “abordagem” ao “torcedor desbocado”. Com a
presença desse segundo policial, o primeiro levou as mãos para trás e se portou
como o mais equilibrado e obediente de todos os PMs.
Aos poucos, a rua foi sendo liberada.
O interrogatório,
porém, se arrastaria por mais alguns minutos. E, assim, a noite seguiu seu
curso... Janelas se fecharam. Era melhor ver a novela das nove, que mostra o
amor entre uma favelada e um agente da Polícia Pacificadora carioca. Melhor
ainda com Roberto Carlos cantando ao fundo:
O cara que pega você pelo braço
Esbarra em quem for que interrompa seus passos
Está do seu lado pro que der e vier
O herói esperado por toda mulher
Por você ele encara o perigo
Seu melhor amigo
Esse cara sou eu
Com todo respeito, Glória Perez, mas seu folhetim devia se chamar:
"SALVE-NOS, JORGE!"
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