Total de visualizações de página

quinta-feira, 3 de janeiro de 2019

Dos achados e dos perdidos






Eu estava próximo ao Cemitério da Paz, aqui no Morumbi, quando duas senhoras, cheias de boas intenções, me abordaram de supetão:

“Jesus te ama, filho!”

No melhor do melhor de mim, devolvi a delicadeza:

“É? Que bom...”

Contentes com aquele meu espasmo de simpatia, elas se animaram e, revistas da religião delas em punho e versículos recitados com fervor, tentaram me convidar para um encontro de jovens:

“Tenho 51 anos...”, avisei.

“Mas é tão moço!”, uma delas disse admirada.

“Só de cara”, rebati.

A outra:

“Sou dez anos mais nova, e olhe só pra mim.”

Eu (não deveria ter dito, mas escapou):

“Muita igreja, talvez.”

Elas se entreolharam, riram contrariadas e, retomando a postura de recrutadoras de almas perdidas, ainda tentaram dar a última cartada:

“Temos que segurar na mão de Jesus, só o Cristo pode nos levar para o paraíso. Sabia que lá, no paraíso, vamos reencontrar todos os nossos amigos e parentes queridos?”

“Então é melhor eu ir para o inferno...”

“Credo!”, gritou a mais alta. 

“Não diga isso, filho!”, emendou a outra.

Por sorte, o sinal já estava fechando para os carros e abrindo para os pedestres. Aproveitei para finalizar:

“Já tô acostumado com o inferno e nesse paraíso aí não vai ter muita gente que conheci, não.”

Cruzei a rua. As duas mulheres ficaram do outro lado, olhando pra mim e cochichando. Evito, faço de tudo para fugir de situações desse tipo. Juro que não sou eu que corro atrás dessas histórias, elas é que me perseguem a todo instante pelas ruas.




Nenhum comentário:

Postar um comentário